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Channel: Iris Figueiredo - Literalmente Falando » Comportamento
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Valeu por tudo, Capricho

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Ontem foi um dia marcante para a Editora Abril. Entre fechamento de redações e venda de revistas para a Editora Caras, muitas pessoas foram demitidas. Mas, no meio desse caos em uma das mais importantes editoras de revista do país, uma notícia pegou muita gente de surpresa: a revista Capricho não vai mais existir em papel. A partir do próximo mês, a publicação vai permanecer só na internet (no site e no aplicativo Capricho Week, aquela versão semanal digital).

Isso é reflexo de novos tempos no jornalismo, mas não estou aqui para ficar debatendo o futuro da comunicação com vocês. Estou aqui para falar do meu amor pela revista, que marcou minha adolescência e de muitas outras garotas.

Sou apaixonada por revistas e é um pouco triste ver que uma parte importante da minha vida vai desaparecer, ao menos da forma como eu a conheço. Apesar de perpetuar algumas ideias problemáticas – e tive o prazer de ver isso mudar nos últimos tempos, acompanhando o site da revista e a própria, que eu comprava volta e meia nas bancas pelo saudosismo -, a Capricho participou da minha formação.

Nunca tive assinatura da revista, mas não perdia um exemplar. Na minha adolescência a Capricho era quinzenal e, quinta-feira sim, quinta-feira não, eu batia ponto na banca de jornal perto da minha escola. Afinal, quinta-feira era dia! Acordava até um pouco mais cedo para passar na banca no caminho do colégio. Tinha um prazer imenso em abrir o plástico, folhear as páginas, mas correr para a última, que tinha a coluna do Antônio Prata.

A Capricho foi tão forte na minha formação como profissional que naquela época, mesmo tentando negar minha veia para a comunicação, eu já fazia ideia do que queria para o resto da vida: escrever. Quando eu lia as crônicas do Antônio Prata na última página, quando eu lia o editorial assinado por editores que pareciam ter um prazer imenso em fazer aquele trabalho… Sem querer, a Capricho me fez escolher meu público: o adolescente. Cores, dramas sobre namoro, amizades, conflitos familiares, problemas psicológicos. Tudo isso estava nas páginas da revista, que falava comigo como pouca gente conseguia. Tudo isso passeia pelos meus livros hoje em dia e sem dúvidas é “culpa da Capricho”.

A revista me fez escolher o que queria ser, mas também me aproximou das minhas amigas e me colocou em encrencas. Que menina nunca foi parar na coordenação da escola ou teve a revista confiscada durante uma aula chata? Eu escondia a minha atrás do caderno e ficava lendo as matérias enquanto algum professor chato falava. Talvez por isso não saiba muita matemática. Mas era divertido demais se juntar com minhas colegas durante o recreio e debater sobre o que a gente via na revista.

Foi a Capricho que me aproximou da internet, de certa forma. Conheci muitos blogs, redes sociais e outras “tendências” que hoje a gente descobre naturalmente por que a revista estava ali para apontar. Lembro até hoje quando saí em uma das revistas, ainda com um blog antigo, lá em 2006. Saí dando pulinhos pela casa: eu estava na Capricho! Dormi com a revista debaixo do travesseiro, de tanta felicidade. A entrevista foi feita pelo MSN e meu antigo blog recebeu centenas de comentários depois daquele dia.

Lembro também quando consegui ingressos para o primeiro NoCapricho Rio, a “balada” da revista, que todas as meninas que eu conhecia sonhavam em ir. Lembro mais ainda de como chorei quando descobri que não poderia ir, já que minha mãe começou a passar mal logo no dia.

Lembro de comprar duas revistas quando saía matérias sobre um artista que eu gostava. Uma para ler e guardar na minha coleção, outra para recortar e guardar em pastinhas sobre meu ídolo. A tal coleção só foi desfeita há uns dois anos, quando descobri que não tinha mais espaço em casa para guardar centenas de revistas que eram carregadas de memórias gostosas.

É meio estranho entender como vai ser o envolvimento das meninas com a revista hoje em dia. Como as capas vão impactar essas garotas, trazendo questionamentos e elucidando coisas sobre a própria vida adolescente. Mas os tempos são outros, então tenho certeza que coisas ficarão marcadas na memória de muitas meninas, mas de outra forma.

É só seguir a página da Capricho para ver que as adolescentes de hoje tem a mesma paixão pela revista que eu tinha na minha época. A relação afetiva delas com a Capricho será outra, completamente diferente da minha. Mas o fim das edições impressas é triste, por ser o fim de uma parte muito representativa na minha vida e de outras pessoas. Também é triste por saber que outras garotas não terão essa experiência tátil, completa, de dividir com outros lado a lado, não pela tela. É estranho perceber que já sou “outra geração” e para essa nova, a relação vai ser diferente, mas não incompleta. É só um novo jeito de lidar com o de sempre.

Mas fica aqui meu agradecimento para a Capricho, pois apesar de continuar on-line, foi sua versão física que me moldou em diversos aspectos. E a relação de carinho vai prevalecer pra sempre.


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